Acolhimento: uma questão de CONFIANÇA

Acolhimento: uma questão de CONFIANÇA

Você confia em todo mundo à sua volta?
Percebe que decidimos confiar ou não numa pessoa?
O que CONFIANÇA tem a ver com o período de acolhimento e adaptação?

A vida social das pessoas é baseada em confiança. Que não brota de “químicas especiais”, mas é construída.

É fato que confiar em alguém envolve os riscos da incerteza. Ao relacionar-se, os seres humanos procuram perceber detalhes e atitudes dos outros e pensar sobre elas: será que este jeito de falar me é agradável? Será que estes gestos me trazem conforto? Gosto do “jeitão” dessa pessoa? Será que esse olhar me convida ou me afasta?

Nós DECIDIMOS a cada momento se e como vamos confiar em alguém. Alguns estudiosos dizem que, aos poucos, este comportamento vai sendo aprendido e se tornando automático. Até lá, o ser humano compara aquilo que está vivendo com o que colecionou ao longo de sua história. Por exemplo, quando eu era pequena, adorava plantas e todas as pessoas vestidas com macacões e que cuidavam de jardins me foram simpáticas, carinhosas e gentis. Nos passeios que eu fazia com meus pais pelas ruas do bairro – num tempo em que as casas não eram muradas – eu gostava de parar e conversar com os jardineiros, que sempre me acolheram. Com isso, até hoje, ao ver pessoas nesta situação, o sinal que soa na minha cabeça é positivo.

Assim, confiança é aprendida ao longo da vida, e é na infância que se constroem as bases de experiências positivas que influenciarão o modo como o ser humano avalia suas interações sociais e as “qualifica”.

Por outro lado, os neurocientistas também afirmam que o ser humano aprende a transmitir confiança. No meio social, é importante que sejamos reconhecidos como pessoas confiáveis para sermos considerados e incluídos pelos grupos. Portanto, desenvolvemos uma construção para CONFIAR (ou não!) e também para, reciprocamente, SER CONFIÁVEL.

 

E o que isso tem a ver com o cotidiano escolar?
Tudo, especialmente no início do período letivo!

O professor precisa ter consciência de que não basta “liderar” sua turma, usar um uniforme ou simplesmente ser adulto para conquistar a confiança de cada criança. Vamos ser observados, acompanhados e avaliados o tempo todo, além de sermos comparados a pessoas e situações já vivenciadas pelas crianças. Ao saber disso, podemos cuidar da escuta e da presença para transmitir atitudes que despertem confiança e também derrubem preconceitos que possamos ter em relação aos pequenos.

Objetivamente, como isso funciona? Do que o professor precisa cuidar para despertar confiança nas crianças?

De início, as crianças olham para o professor e fazem uma leitura instantânea de sua aparência e expressões. Olhares, gestos, postura e tom de voz passam uma “mensagem” diferente para cada indivíduo, que avalia o comportamento dos colegas em relação ao professor e junta essa percepção às que realizou ao longo da vida. Rapidamente as crianças formam um julgamento e, se formos perspicazes, sentimos esse posicionamento. Ao prestar atenção e refletir sobre as reações da turma, podemos ir modulando estratégica e intencionalmente nossas interações:

  • Seria melhor baixar o tom de voz com essas crianças?
  • Será que estas crianças estão compreendendo o que eu falo? Será que estou compreendendo o que elas querem me dizer?
  • Se eu der mais atenção/ouvir esta criança, demonstro confiança e reciprocidade?
  • Estou permitindo que as crianças se expressem?
  • Estou dando tempo para as crianças pensarem/responderem/resolverem os problemas?
  • Estou valorizando as tentativas, erros e acertos?
  • Será que estou corrigindo demais a turma?
  • Será que preciso confiar mais nas crianças?
  • Talvez fosse interessante sentar mais próximo delas?
  • E se eu usar uma roupa mais descontraída e me colocar mais próximo das brincadeiras?
  • Será que esta criança precisa de tempo/espaço para confiar?
  • Será que este menino precisa de proximidade e toque?
  • Talvez eu precise criar situações específicas para incluir mais este pequeno?

Num casamento entre observar as crianças e a nossa prática, refletimos e planejamos os melhores caminhos para investir no aprendizado da confiança e da reciprocidade.

 

Mais um fator importante…

Finalmente, em se tratando de um processo de aprendizagem, o tempo é um fator fundamental. Como vimos, as atitudes observadas no dia a dia vão se somando e construindo a noção de confiança. O conjunto de pequenas e grandes demonstrações de que “sou confiável” estabelecem a reputação do professor e, ao mesmo tempo, repertoriam as crianças com estratégias para que elas busquem modos de serem recíprocas, devolvendo atitudes que sinalizem que elas também são dignas de confiança. Isso tudo demanda tempo! Por isso, os pesquisadores ressaltam que o sentimento de confiança é dinâmico, aprendido ao longo da vida, tem um funcionamento imediato e instintivo e outro que, com o tempo, pode ser aprendido e transformado.

 

Para pensar…

Abrindo um parêntese nesta discussão, em 1998, o pesquisador americano Greenwald e seus colegas estudaram a primeira reação das pessoas frente a diferentes gêneros e etnias. Veja como este estudo foi importante: se utilizamos as nossas experiências anteriores para guiar o primeiro posicionamento sobre confiar ou não numa pessoa, características visuais marcantes podem influenciar positiva ou negativamente nesse processo. Assim, dependendo da vivência das crianças com pessoas de diferentes etnias e gêneros, podemos esperar formas diversas de confiar ou não, em primeira mão. Considerar esse estudo é fundamental para refletir sobre as reações imediatas das crianças em relação ao professor, colegas e outros profissionais da escola, e criar estratégias para construir novos posicionamentos e aprendizados.

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PARA SABER MAIS…

Dois artigos científicos e uma palestra do YouTube embasaram esta postagem:

Publicamos diversas postagens sobre o tema do acolhimento e adaptação das crianças no início do período letivo. Confira: 

30 comments

Tudo começa no acolhimento, no primeiro dia de aula no momento em que o professor ou educador recebe a criança.
Devemos ter consciência que ela não escolheu estar ali e se recebida com carinho e afeto, com certeza será o inicio de um ciclo de amizade e confiança

Tudo começa no acolhimento, no primeiro dia de aula no momento em que o professor ou educador recebe a criança.
Devemos ter consciência que ela não escolheu estar ali e se recebida com carinho e afeto, com certeza nesse momento se iniciará um ciclo de amizade e confiança

É Verdade, Ana, mas as crianças tem um universo de contextos novos para explorar e isso é da natureza delas. Isso é um ponto de partida interessante para as escolas fazerem de um limão, uma limonada! Isto é, aproveitar a natureza desbravadora da criança e mostrar para ela que a escola é um ambiente importante e seguro para a vida inteira 😉

É necessário sermos uma rede de apoio e confiança para que as crianças possam criar laços e afeto, proporcionando a elas um ambiente propicio a descobertas e explorações.

Sabendo que no acolhimento começa a construção do elo de confiança e afeto, é de suma importância termos um olhar mais atento das nossas atitudes para com a criança durante este momento.

Seria muito bom se os professores também tivesse um curso deste, de reciclagem e de formação dos novos professores. Muito do que li aqui, seria bom se pudesse ser implementado na prática não só pelos agentes, mas por todos que atuam na educação infantil.

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