Identificamos uma angústia nos professores que os paralisa e bloqueia o exercício do registro: é preciso registrar e refletir sobre todos os momentos e todas as crianças? Como é possível observar, anotar e fotografar quando precisamos estar atentos ao desenvolvimento da proposta, à mediação, ao cuidado e sem deixar de lado os interesses individuais? O que dizer então sobre o número exagerado de crianças pequenas nas turmas de Educação Infantil? Finalmente, como desviar a atenção dos pequenos que sempre se sobressaem ou monopolizam nossa cota de cuidados?
Não são poucos os motivos que justificam as angústias de ter que se transformar num super-professor com poderes extraordinários! Mas não temos superpoderes… Por isso, o caminho é o foco! Como assim?
Foco das energias naquilo que precisamos descobrir. Regular as antenas para o que é importante registrar e, depois refletir sobre!
Assim, é preciso planejar e organizar a proposta (o fazer pedagógico) e AQUILO QUE QUEREMOS DESCOBRIR. Refletir e olhar para a própria prática e se perguntar:
O que estou precisando saber?
Quais aspectos das aprendizagens ainda estão nebulosos?
Quais crianças estão demandando meu foco?
Quais pequenos estão fora do meu foco há um tempo considerável?
São respostas a essas perguntas que podem indicar caminhos. Desse modo, as energias do professor, divididas entre tantos fazeres, encontram espaço para investigar a própria prática e se inspiram nela para encaminhar novar propostas contextualizadas. Assim, deixamos de precisar usar a cartola mágica para desenterrar fórmulas de atividades descoladas da nossa realidade e do ritmo das nossas crianças.
Ok, pensamos na importância de focar o olhar para as questões mais pertinentes ao momento do grupo. Mas ainda assim é complicado colocar em prática a disciplina de observação. Por isso, compartilhamos algumas dicas:
→ É preciso e possível registrar TUDO o que acontece com todos e em todos os momentos?
Na nossa visão, a resposta é NÃO!
Vejamos por esse lado: quais situações podem trazer respostas pertinentes para aquilo que preciso saber e que ainda não sei? Quais ocasiões podem trazer respostas importantes para reencaminhar a minha prática? Em quais momentos posso acompanhar aspectos específicos das crianças que provavelmente revelarão fragilidades e conquistas?
Pois é… não é preciso liberar toda a memória do celular para fotografar 5 dias por semana de rotinas e atividades para levantar todas essas informações. O material levantado com o ato de registrar precisa ser revisitado e refletido para apontar caminhos para você mesmo. É necessário organizá-lo para que se transforme numa documentação e revele as aprendizagens para as crianças, para a sua equipe e para as famílias. Nesse sentido, não estamos falando em transformar cada instante em “álbum de recordações”!
Concluindo, perguntamos: qual proposta pode revelar informações importantes sobre as crianças? Ao aproveitar essas ocasiões específicas, o foco na observação e no registro levarão a um material rico para refletir, descobrir e reencaminhar.
Como as crianças brincam e aprendem durante todos os momentos da rotina, como refeições, higiene etc., também podemos identificar informações importantes e reveladoras. Então, que tal se preparar para observar e registrar um almoço específico para levantar como está a motricidade ao segurar os talheres? Que tal perceber como as crianças estão se relacionando e fazendo escolhas?
As atividades de higiene são ótimas para expor a autonomia. A chegada à escola dá indícios da adaptação das crianças e da forma como as famílias estão interagindo com o ambiente escolar.
Tudo isso sem angústia! É pensar sobre o que se quer descobrir, se preparar e observar um dia, um momento específico. Liste as oportunidades e disponha delas para responder suas perguntas!
→ Durante as atividades, como dedicar parte da atenção para observar e registrar momentos significativos? Como se dividir entre cuidar, mediar e registrar?
Que tal experimentar a observação em sequências que privilegiem a autonomia das crianças? Como exemplo, os cantos de atividades diversificadas são ótimos para que o professor possa se distanciar e observar. Propostas com materiais mais abundantes e que perseguem os interesses das crianças também mobilizam os pequenos e favorecem as ações de registro do professor.
Mas… e aqueles pequenos que são sempre os atores principais da turma, que nos ocupam o tempo todo? Como ter a oportunidade de dedicar atenção aos outros? Esse ponto nos lembra de um menino fofíssimo de um CEI de São Paulo, que mordia seus colegas num piscar de olhos. As professoras ficavam emocionalmente estressadas porque não se sentiam à vontade para desgrudar os olhos do pequeno. Numa proposta com instrumentos musicais descobrimos o gosto e os interesse do menino por violinhas, violões e guitarras. Era só colocar uma música para que ele agarrasse um dos instrumentos e acompanhasse o ritmo! Delícia de ver… e ótima dica! Cada vez que as professoras precisavam levantar informações com “tranquilidade”, planejavam um canto com música e instrumentos para que o pequenino se descobrisse nele. Por incrível que pareça, a descoberta e a satisfação de outros interesses levaram o menino a se desinteressar das mordidas!
→ Ainda sente que precisa de ajuda? E precisa mesmo!
É por isso que trabalhamos em equipe. E é por isso que os planejamentos não são uma burocracia, mas um facilitador do nosso trabalho.
Veja, você está planejando uma proposta com embalagens para provocar construções tridimensionais. Empilhamentos, ocupação do espaço, equilíbrio, comparação de tamanhos, formas e pesos, composição estética e uma infinidade de habilidades e conhecimentos a serem trabalhados, observados e registrados. Como conduzir a atividade, intervir e observar? Peça ajuda! Se você se planejar pode combinar com a coordenação ou com o professor volante um acompanhamento conjunto da proposta. Com antecedência, é possível até compartilhar com o “ajudante” o que você espera que aconteça, características dos pequenos e as situações que pretende focar.
Outra possibilidade é dividir o grupo. Você pode combinar com o professor de outra (ou outras!) turmas para receber parte do seu grupo em duas ocasiões, num momento de pátio, por exemplo. Desse modo, com metade do grupo, é possível focar melhor na observação e nas singularidades. Depois, faça o mesmo pelo seu colega! Em um relato, a profª Keli nos conta que apresenta propostas novas a pequenos grupos, enquanto os demais estão no rodízio do almoço. Isso é outra possibilidade…
Encarando as ações de observar, registrar e refletir sobre as informações levantadas, como uma ferramenta que facilita o trabalho e indica caminhos, se preparar e fazer essas ações deixa de ser um fardo burocrático. Planejar, observar, refletir e documentar passam a ser uma necessidade natural da prática pedagógica. Priorizamos a qualidade das observações e dos registros de alguns momentos e deixamos de agir no “atacado” e sem qualidade. E aí…. adeus angústia!
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Publicamos diversas postagens que aprofundam cada um dos temas tratados nesse texto. Você pode acessá-los e complementar sua reflexão:
- Por quê fazer registro?
- Gisa Picosque fala sobre a importância de fazer registros e sua arte
- Registrar… não tão fácil, mas poderoso!
- Um roteiro para começar registro e planejamento – parte 1
- Um roteiro para começar registro e planejamento – parte 2
- Na prática: a documentação pedagógica, relatos, registros e reflexões
- Palavra de… Amanda Teagno Lopes: planejar, registrar e documentar
Ótimo curso! Voltado a prática real do dia a dia nas creches! Muito relevante
Bom dia!
Grata pelo aprendizado adquirido, um olhar atento para cada criança buscando conhecer suas particularidades através da observação, registro, conhecendo cada um diante das brincadeiras apresentadas.
Atuo no berçário 2 e o registro e maneira mais completa de conhecer a criança como um todo, através observação e do registro conseguimos enxergar as necessidades individuais de cada criança. Obrigada por essa leitura cheia de significado.
Agradeço por proporcionar textos significativos.
Dayane,
Obrigada pelo retorno!
Abraço.
Maravilhosos não Dayane, eu amei.
Como professora de berçário ao observar as crianças, o registro se faz necessário para preservar as lembranças da prática pedagógica, onde o professor poderá recorrer para reflexão ou replanejamento.
Por exemplo: existe intercorrências naturais em sala de aula com os pequenos, que graças ao registro melhoramos o desempenho nas atividades para um semestre seguinte.
Outro exemplo é quando uma atividade não obteve resultados pretendidos, o educador deve assumir a responsabilidade e a decisão de replanejar o conteúdo sem culpar as crianças e a escola.
Quando concluímos um determinado projeto, fica a sensação de alguém ter visto e comentado o que fizemos no caminho. É como viajar para um lugar muito lindo e não tirar fotos ou gravar um vídeo.
O registro relata o que fizemos durante o percurso, onde todos saem ganhando: pais, professores e crianças.
O educador não deve ver o registro como algo desnecessário ou ruim.
Os registros diários dão mais consistência à pratica do que foi planejado.
Esse registro em forma de relatório avulso ou em caderno, demostra a trajetória de cada criança, formando um roteiro da atividade pedagógica. Podemos compartilhar os processos vividos pelas crianças do grupo com a família, coordenação, direção e colegas de trabalho.
As famílias se aproximam à escola pelo compartilhamento das realizações e estreitam as relações numa parceria forte e comprometida.
Dayane,
Muito obrigada por compartilhar sua visão! Concordamos com você em gênero, número e grau!
O registro reflexivo é mais do que o ato em si, ou seu produto (notas, imagens e produções). Sua existência revela uma prática educativa reflexiva. Quando o professor – e qualquer profissional – reflete sobre sua prática, como Madalena Freire nos diz, provoca a angústia e a dor de se confrontar com os erros e acertos… mas cresce!
Abraços!