Planejar propostas de atividades repetidas para crianças é cair na mesmice? É bom ou ruim para elas? Fazer atividades uma só vez constrói saberes?
Vamos pensar um pouco: imagine que você chegou numa ilha onde as plantas, os animais, a comida, a língua, a música, a arquitetura e os costumes são muito diferentes dos seus.
Um passeio de 24 horas é suficiente para conhecer um mundo tão diferente? Um dia basta para ter ideia do que acontece por lá?
A primeira etapa da vida do ser humano é como uma viagem a um mundo desconhecido. Nos primeiros anos os pequenos poderiam dizer “muito prazer em conhece-lo” a toda hora, porque tudo é novo e está sendo observado, explorado e conhecido.
Retomemos a pergunta inicial: basta uma espiadinha, uma rápida brincadeirinha para se apropriar do mundo desconhecido que nos cerca, construir olhar e significados?
Certamente, não!
A professora sueca Riina Lundell, da pré-escola Trångsund, na Suécia, disse ao Tempo de Creche que com crianças, fazer uma vez é o mesmo que não fazer.
Nos primeiros contatos, as crianças pesquisam os materiais, os movimentos ou as situações. Testam qualidades e possibilidades. Depois de estabelecerem relações, começam a experimentar e criar com mais complexidade, foco e, dependendo da faixa etária, interagindo com os colegas.
Já observou uma criança experimentando a argila pela primeira vez? Ela amassa o material, espreme entre os dedos, bate, atira, passa na pele e até coloca na boca. Algumas apresentam certa resistência para entrar em contato e precisam de tempo e atenção diferenciados.
Só depois de algumas oportunidades é que as crianças começam a descobrir como modelar a massa, controlar a força, compreender as resistências e as delicadezas do material, lidar com diferentes volumes e, finalmente controlar a modelagem para transformar a argila de acordo com seus desejos. Como tudo o que nos cerca, as características do que existe são sempre diversas e permitem interações e explorações particulares.
Projetos também podem demandar a repetição de propostas e percursos mais longos. Ao identificar temas que interessam às crianças, o professor busca caminhos para favorecer experiências e aprofundar as pesquisas e descobertas. Essa trajetória precisa de tempo e repetição. Ao descobrir e aprender sobre os diversos assuntos, as crianças – e todos nós! – precisam retomar os saberes construídos ao longo do caminho para correlacionar, somar e continuar aprofundando o interesse e a busca por novos conhecimentos. É como estar numa espiral que a cada volta retoma o percurso vivido porém de maneira mais ampliada.
Segundo Riina, tempo e repetição são fundamentais para que as crianças aprofundem pesquisas e, nesse percurso, ampliem habilidades e se desenvolvam.
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PARA SABER MAIS…
→ A postagem Repetir propostas para crianças. Será? também aborda essa questão propondo algumas reflexões. Vele a pena ler!
→ A Pré-escola Trångsund está localizada na região de Trångsund, nos arredores da cidade de Estocolmo, na Suécia. Essa é uma das escolas em que a pesquisadora e professora Liselott Mariett Olsson fez diversas pesquisas e me levou para conhecer de perto. A equipe do Tempo de Creche acredita e se fundamenta, entre outros pensadores, na produção acadêmica de Liselott, que, por sua vez, pensa a educação das crianças pequenas a partir da filosofia de Gilles Deleuze e Felix Guattari, magos e inspiradores do Blog.
Ótima matéria. A repetição é fundamental no processo de desenvolvimento da criança. Toda vez que proporcionar a mesma atividade, a criança mostrar um novo contexto de aprendizagem.