Um grande número de atividades de creches e pré-escolas apresentadas nas redes sociais nos fazem pensar sobre a qualidade da educação praticada com as crianças pequenas. Ainda é possível observar que muitos educadores valorizam as “atividades” e esquecem do personagem principal de todo e qualquer planejamento pedagógico: a criança criativa, seus interesses, necessidades e percursos de aprendizagem e desenvolvimento.
Muitos dos conteúdos pedagógicos da Educação Infantil postados nas redes sociais pertencem a um universo ultrapassado da Educação Infantil.
Um número significativo de experiências pedagógicas compartilhadas mostra crianças “enquadradas”, com pouco espaço para o exercício da criatividade, a resolução de problemas e o desenvolvimento da autonomia.
O que quero dizer com isso?
São diversas indicações de atividades centradas em professores que assumem postura diretiva e retratam propostas baseadas em folhinhas impressas para colorir, pobreza estética e a valorização da mão do professor na elaboração de materiais com imagens estereotipadas de EVA. Pouco se nota da escuta, das descobertas e das contribuições das crianças nos processos de aprendizagem. Em resumo, divulgam-se atividades que não valorizam a identidade, a singularidade e a aprendizagem por meio de experiências e construção de conhecimentos.
A criança pequena, cuja curiosidade e iniciativa é valorizada, pode se colocar nas situações que vivencia. Ela tem espaço para “se interessar/não se interessar”; “perguntar/ouvir”; “saber/ainda não saber”; “entender/não entender”; “pensar igual/pensar diferente”; “querer repetir/querer inventar/ querer descobrir”… enfim, são crianças que têm posicionamento e certamente participam do próprio processo de aprender e se desenvolver.
Para o teólogo, filósofo e pesquisador da Educação, Cipriano Carlos Luckesi, as aprendizagens complexas dão base para aprofundamentos e criatividade: “só cria quem entende”. O ser humano é ativo. É um ser de movimentos, mesmo que esteja aparentemente quieto. Na sua quietude, certamente os neurônios estão em movimento. O ensino mecânico não considera os movimentos internos e externos das crianças e, com isso, não constrói uma aprendizagem baseada no “querer saber os porquês”, para entender, aplicar e recriar (LUCKESI, 2011). Só nesse estágio é que a criança se transforma, conquista autonomia e pode transformar o mundo.
Já crianças que foram formatadas em comportamentos condicionados, perdem a curiosidade, o desejo de pesquisa, a criatividade, o encantamento pela descoberta e a certeza de que podem aprender, inventar e participar do que acontece ao seu redor. Essas são as bases para formar crianças pensantes, inteligentes, críticas e que conhecem os próprios jeitos de se organizar para aprender.
Muitas das propostas divulgadas na internet atropelam o potencial das crianças e, como diz Madalena Freire, no lugar de oferecer “FÓRMAS”, as colocam em “FÔRMAS”.
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PARA SABER MAIS…
→ Cipriano Carlos Luckesi é teólogo, filósofo, doutor em Educação: Filosofia e História da Educação e especialista em Avaliação. Hoje é professor aposentado, orientador de pós-graduandos e integrante do Grupo de Pesquisa em Educação e Ludicidade da Universidade Federal da Bahia. O livro consultado nesse artigo é Avaliação da aprendizagem. São Paulo: Cortez, 2011.
→ Madalena Freire é uma das inspirações do Tempo de Creche. É pedagoga e arte- educadora. Dedica-se desde 1981 à formação de educadores com grupos de reflexão e estudo. Foi fundadora do Espaço Pedagógico em São Paulo e presta assessoria a instituições públicas e particulares em todo o território nacional.
Leia mais sobre Madalena Freire e o tema desta postagem em:
Se entendi, as práticas que se propõem nas creches e pré-escolas são voltadas no final para o que o professor acha que seja adequado, ou o que seja tradicional e correntemente praticado. Por outro lado, há muito pouco publicado como pensa a criança. Acho que a neurociência educacional possa contribuir com respostas, mas está ainda na sua infância!.
O artigo oferece denúncias do que não fazer, mas não achei/entendi o que fazer. Algo mais claro e cristalino de Madalena Freire seria desejável? Esclareço que trabalho com alunos de Pedagogia e professores em exercício.
Amauri,
Obrigada pelo retorno pertinente!
De fato, essa postagem se pautou mais na “denúncia”, ainda que trouxesse a fundamentação do Luckesi e imagens de propostas interessantes para que despertassem comparações. Outras postagens detalham especificamente as questões criticadas: planejamento de propostas desafiadoras, importância da curiosidade, documentação pedagógica, experiência e aprendizagem, entre outras. Quanto à citação da Madalena, quem sabe conseguimos uma fala da mestra para que ela própria esclareça?
Abraços!
Certo, obrigado! De fato foi dada algumas pistas. Vamos ver quem sabe Madalena diga mais alguma coisa.