O currículo integral e formação de professores na Educação Infantil

O currículo integral e formação de professores na Educação Infantil

Tempo de Creche conversou com Janaina Maudonnet, mestre em educação e especialista em educação em direitos humanos, sobre o currículo integral – ou holístico – e seu potencial nas descobertas da cultura e singularidade das crianças e as demandas na formação do professor na Educação Infantil.

Acervo pedagogia com a Infância

Tempo de CrecheO que é o currículo para a Educação Infantil?

JanainaAo tratarmos de currículo na Educação Infantil, estamos falando do modo de organizar as práticas educativas: os espaços, as rotinas, os materiais que disponibilizamos às crianças, as experiências com as linguagens verbais e não verbais que lhes serão proporcionadas e os modos de acolhimento na instituição.

A forma como organizamos essas práticas tem por trás ideias sobre a finalidade da educação, a maneira como os sujeitos aprendem, o que se deseja que eles aprendam, que tipo de homem queremos formar e para qual tipo de sociedade. Trata-se de uma prática complexa, que necessita de permanente reflexão por parte dos adultos que a oferecem.

Tempo de Creche – O que nos dizem as Diretrizes Curriculares Nacionais sobre currículo?

JanainaAs Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil apontam a necessidade de considerar os saberes, as curiosidades e as manifestações infantis na organização curricular. Nas bases dessas Diretrizes está uma concepção integral – ou holística – de currículo.
O currículo integral – ou holístico – tem como pressuposto que a aprendizagem se dá ao longo da vida e que o currículo deve apoiar o desenvolvimento e os interesses das crianças. As brincadeiras, as interações e os projetos realizados através da escuta atenta e da consideração das manifestações infantis são os pilares. A criança é um todo: corpo, mente, emoção, criatividade, história e identidade social. As áreas do conhecimento não são excluídas, mas o currículo é aberto e global, trabalha-se a partir de um amplo projeto que abarca múltiplas experiências. Os projetos envolvem três pilares: linguagem, negociação e comunicação e tem como eixo a investigação e a construção de hipóteses.


Tempo de Creche – Como o trabalho cooperativado ajuda no desenvolvimento de um currículo integral – ou holístico?

JanainaO trabalho cooperativo é um forte princípio do currículo holístico. Acredita-se que as crianças aprendem a gostar de trabalhar juntas e partilhar ideias. Por isso, as iniciativas e as produções de significados das crianças são encorajadas.
O trabalho nessa perspectiva exige uma maior complexidade na formação e ação dos professores. Exige o aprendizado de uma escuta atenta das crianças nos diferentes momentos da rotina e uma ampla formação cultural para oferecer experiências que ampliem os conhecimentos infantis. Ampliar nossa formação nas diferentes linguagens expressivas – dança, música, artes visuais, escrita, ciências, matemática, … –  ajuda a nos repertoriar e oferecer propostas mais ricas e plenas de sentido para as crianças, desde que estejam conectadas com os sujeitos concretos com as quais trabalhamos cotidianamente.
Em geral, nos estágios na formação inicial, somos orientadas a observar a didática do professor e as atividades oferecidas, mas pouco refletimos sobre os saberes e manifestações das crianças. Trata-se de uma ampliação de olhar, na qual é preciso observar não só o que é oferecido à criança, mas de que maneira ela se relaciona com essa prática, como recebe as propostas e o que nos revela através de palavras, gestos, empolgação e recusas. 

Acervo Casa da InfânciaNo texto: “Aprendendo a ser professora de bebês”, Andressa Celis Souza e Vanilda Weiss descrevem como foram aprendendo a escutar os bebês e transformando suas práticas a partir desse exercício. Uma atividade oferecida às crianças de 8 meses a dois anos foi pintar, com tinta, flores previamente recortadas por elas para enfeitar a instituição por ocasião da primavera. As crianças se interessaram muito mais pela experiência de sentir a tinta, tocar, esparramar, do que pela realização da comanda dada pelas educadoras, o que gerou primeiramente uma sensação de frustração, e em seguida um questionamento sobre as razões da reação das crianças. Essa experiência possibilitou que as educadoras percebessem que outro encaminhamento era necessário. Em um segundo momento ofereceram novamente a tinta às crianças, mas dessa vez em uma exploração muito mais livre, com um amplo espaço para que pudessem explorar as tintas e materiais de apoio (rolo, pincéis,…). As crianças ficaram por muito tempo nessa atividade, explorando as misturas das cores, sentindo as texturas, observando as reações da tinta no papel, o que revelou às educadoras que as crianças pequenas aprendem a partir da movimentação corporal em espaços amplos e desafiadores.

Acervo Nova Escola

Tempo de Creche – O que o currículo integral – ou holístico demanda do professor?

Janaina – O trabalho sob a perspectiva de um currículo integral exige que adotemos atitudes de disponibilidade e escuta para o outro e um desejo profundo de compreender como as crianças aprendem e se relacionam com o mundo. Nossa formação ainda é muito centrada na atividade e pouco nas crianças, todavia, como afirma Maria Lucia Machado:  (…) o pedagógico não está na atividade em si, mas na postura do educador, uma vez que “ não é a atividade em si que ensina, mas a possibilidade de interagir, de trocar experiências e partilhar significados é que possibilita às crianças o acesso a novos conhecimentos”.

Fotografar, filmar a reação das crianças enquanto lhe são oferecidas as propostas educativas e analisar coletivamente – com nossos colegas – essas manifestações nos ajuda a sair do senso comum, nos aproximar das teorias estudadas e produzir conhecimento sobre a infância e educação infantil. Essa documentação dos fazeres infantis é um caminho fundamental para qualificarmos nossas práticas e oferecer cada vez melhores experiências para as crianças. Significa assumir que não sabemos tudo e que somos permanentes pesquisadores e experimentadores da nossa prática.

Acervo Angela Rizzi

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Janaina MaudonnetJanaina Maudonnet – Doutoranda em Educação pela Universidade de São Paulo. Graduada em Pedagogia e mestre em Educação pela Universidade de São Paulo. Especialista em Educação em Direitos Humanos pela Universidade Complutense de Madri. Formadora de gestores e professores de Educação Infantil em redes municipais no Estado de São Paulo. Membro da comissão gestora do Fórum Municipal de Educação Infantil de São Paulo/ FEMEISP. Foi professora titular de Educação Infantil da Prefeitura Municipal de São Paulo

6 comments

Olá, Flaviene. As postagens que enfocam mais especificamente esta faixa etária podem ser encontradas na listagem por temas na aba Bebê e Emmi Pikler. Boa leitura. Qualquer dúvida entre em contato! Abraço.

Boa noite, gostaria de sugestões de livros e autores que falem sobre sustentabilidade para formação de professores . Agradeço a atenção.

Olá, Lilian. Obrigada pelo retorno. Você poderia esclarecer o que quis dizer com – sustentabilidade para formação de professores? As postagens relacionadas à formação dos professores estão reunidas na aba – Coordenação e Gestão. Abraço

Sou professora do curso do Magistério, e gostaria de saber que livro posso saber mais sobre a Disciplina Aprendizagem Infantil através de experiências.

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