O ser humano é singular: características pessoais e de contexto o tornam a humanidade um coletivo de pessoas únicas. Algumas moram nas cidades, outras escolheram o campo, muitas estão nas praias de mar, nas margens dos rios, nas matas… são inúmeros ambientes, comunidades e culturas. E em todos eles encontramos sons e música, que estão na casa, nos da rua, nos bairros, nas vilas, nas pequenas comunidades e por todas as cidades.
Em um bate papo com a professora e musicista Camila Bonfim, ela nos propõe parar e perceber os sons que banham nossas vidas para conversar sobre eles.
Logo de início surge a pergunta: por que falar em sons e não em músicas?
Camila explica que a música nasce de uma sucessão de sons e silêncios ao longo de um determinado tempo. Por isso, precisamos primeiro compreender os sons, que são a matéria prima da música!
→ Você já pensou nisso? Já prestou atenção nos sons que existem no lugar onde você mora? Eles são semelhantes aos sons ouvidos ao redor da escola?
Faça um minuto de silêncio e tente perceber os sons ao seu redor.
Os sons são resultado das características ambientais e de todos os ruídos produzidos por pessoas, máquinas, natureza e muitos outros elementos. Desse modo, é até possível concluir que o som ao redor para quem vive à beira mar é completamente diferente do som de uma grande cidade. Cada ambiente tem a sua sonoridade específica, com semelhanças e diferenças.
Camila convida: que tal tentar ouvir os diversos sons ao redor e procurar identificar todos eles? Isto é, de onde eles vem e o quê os produz: é som de carro, de buzinas, das construções, do vento batendo nas árvores, dos pássaros? Fique o máximo que puder em silêncio e ouça, com atenção, os sons ao seu redor. Se houver algum aparelho elétrico ligado por perto, é melhor desligá-lo.
A sua experimentação é importante para que possa, depois, escolher o que propor para as crianças e assim, compartilhar essa pesquisa. Ao viver esse percurso de experimentação dos sons, você pode identificar o que é fácil perceber, o que pode representar um desafio para o seu grupo e os possíveis caminhos para aprofundar a investigação.
Camila propõe alguns questionamentos para provocar os sentidos:
→ O que você ouve?
→ Você percebe as diferenças entre os sons?
→ O que podemos dizer sobre eles?
→ São rápidos, ou longos?
→ São fortes, ou fracos?
→ São altos, ou baixos?
→ Estão pertos, ou longe?
→ E a voz das crianças, são todas iguais?
São muitas perguntas, que levam a mais uma: será todos os sons que ouvimos possuem todas essas propriedades?
Camila esclarece que todos os sons têm características comuns chamadas de qualidades do som.
Qualidades do som
→ Você sabe quais são as qualidades do som?
Vamos descobrir e entender os sons.
→ Você já se assustou com o som de uma porta batendo forte? Tente lembrar-se de outros sons que já lhe assustaram: quais são eles?
O som de uma porta batendo forte tem relação com a intensidade, que é a característica que faz o som ser mais forte ou mais fraco. O som de uma batida de carros geralmente é bem forte. A intensidade é uma qualidade do som.
→ Que duração tem o som que você está escutando?
O som de um apito de juiz de futebol às vezes é longo e às vezes é curto. De um guarda e trânsito, também. O som da máquina de lavar roupa durante a lavagem, é um som longo e , para alguns, irritante. Igualmente o motor de um carro. Já quicar a bola no chão produz um som curto. A marca da batida do caminhar é curta. A duração desses e muitos outros sons é outra qualidade do som.
→ Você já classificou algum som, como a voz de uma pessoa, de grave ou aguda?
Em geral, homens adultos e mais velhos têm voz grave, enquanto o menino ainda criança tem a voz aguda. Nos animais, por exemplo, o miado de um gato é agudo e o rugido do leão é grave. Estamos falando da qualidade denominada altura.
Experimente produzir sons graves e agudos, pode ser com a sua voz ou com uma batida no corpo.
Experimente bater palmas com as mãos abertas e depois com a mão em forma de concha. Percebe a diferença?
A palma com a mão aberta é um som agudo, já a palma com a mão em forma de concha produz um som grave.
Agora vamos compreender os timbres.
→ O que é timbre?
O timbre é a qualidade que dá a característica mais específica do som, e que permite reconhecer sua origem. Por exemplo, a voz dos seus alunos é diferente, apesar de todos estarem na mesma faixa etária. Você sabe disso porque o timbre de cada um é único, assim como o timbre de cada som produzido pela voz, por algum instrumento musical e por tudo mais que produz som.
Vamos voltar à porta batendo e aos sons que já lhe pregaram um susto.
→ Quais seriam as suas características?
O som de uma porta batendo tende a ser, em geral, um som forte, curto, grave e com timbre de madeira batendo contra madeira. Nesse caso, é bom lembrar que o som depende do material da porta, do batente no qual ela bate e tantas outras variáveis.
Camila reforça que estas informações são importantes para que o professor/a possa oferecer situações de vivência musical qualificada e intencional, de modo que os bebês e as crianças pequenas tenham um alicerce sólido para iniciar a construção do conhecimento musical, sempre pela brincadeira, pela curiosidade e pela descoberta, para aprender a identificar e pesquisar os sons.
Sabemos que a expressão musical na faixa etária das crianças da Educação Infantil tem ênfase nos aspectos intuitivo e afetivo, por meio de explorações de materiais e situações que utilizam a inteligência prática ou sensório-motora (PIAGET, 2004*[1]). Isso se dá com a manipulação de materiais sonoros. Ao explorarem os sons, as crianças pequenas se movimentam, fazem gestos, cantam, balançam o corpo, entram em contato e pesquisam os sons dos objetos.
As propostas de atividades para a prática musical nesta faixa etária devem incluir a vivência e a pesquisa com as variações de timbres, de altura, intensidade, duração, ritmos, percepção e diferenciação entre som e silêncio. As atividades de música devem ainda oferecer a escuta de músicas com diferentes organizações instrumentais e variados estilos.
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Para saber mais
[1] *PIAGET, Jean. Seis estudos de psicologia: tradução Maria Alice Magalhães D’Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. 24ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.
[2] STIFFT, Kelly. A construção do conhecimento musical no bebê: um olhar a partir das suas relações interpessoais. 2008. 332 f. Tese (Doutorado em Educação). Porto Alegre: UFRGS.
Kelly Stifft também está citada citada no artigo O DESENVOLVIMENTO MUSICAL DOS BEBÊS DE ZERO A DOIS ANOS: práticas pedagógicas
Para saber mais no Tempo de Creche
→ Música, brincadeira e desenvolvimento
→ Brincadeiras com os sons: musicalização para os pequenos
→ Musicalização no dia a dia de bebês e crianças
→ Vamos brincar e conhecer a música indígena?
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Camila Carrascoza Bomfim
Musicista e contrabaixista, formada em Contrabaixo pela Faculdade de Artes Alcântara Machado, mestre e doutora em musicologia pelo Instituto de Artes da Unesp, professora e autora de artigos e capítulos de livros de educação musical.
Este artigo é muito bom , pra os professores trabalharem música na educação infantil. Nota 1000.