Uma das qualidades mais importantes do professor é a paciência! Mas ao contrário do que se pode pensar ao ler essa afirmação, a paciência em questão está relacionada ao acompanhamento do ritmo das crianças e o precioso tempo de aprender. Estamos falando da paciência com a ansiedade de interferir.
O professor, além de garantir:
• um planejamento motivador e compatível com o interesse dos pequenos,
• a organização de materiais e espaços provocadores,
• a preparação de estratégias para fazer a mediação,
ele também precisa incorporar uma calma transcendental…
Como assim?
Vamos imaginar uma situação comum ao quotidiano da creche. Num grupo na faixa de 24 meses, uma das crianças, capturada por uma série de caixas, descobre que empilhá-las pode ser muito interessante. Vê-se entusiasmo nascer no brilho dos olhos do pequeno. Percebe a sua intenção porque, a essa altura, já o conhece a fundo.
Ele coloca uma caixa no chão, pega outra e posiciona sobre a primeira.
Repete a operação com uma terceira caixa, desta vez, menor que as outras.
Detém-se por alguns instantes para admirar a construção.
Levanta, atravessa a sala, escolhe outra caixa esquecida num canto e a leva de volta para sua torre.
Senta-se e cuidadosamente coloca a caixa, maior que a anterior, sobre a pequena caixa do topo.
Como está o professor a esta altura, que acompanha com atenção e entusiasmo as ações do pequeno? Como você estaria?
Eu estaria ansiosa, torcendo para tudo dar certo!
Continuando com a cena, a caixa garimpada do outro lado da sala não está parando sobre a pilha. O pequeno, sentido a fragilidade do equilíbrio, reluta mas acaba soltando a caixa.
Tchi bum! A torre desaba e vai ao chão!
O professor se compadece da desilusão da criança e comenta: Fulano, que montagem bacana! Não quer tentar novamente?
O pequeno inicia o processo e, no final dele, já estamos vivenciando a ansiedade de novo.
Tchi bum! Tudo vai ao chão novamente… e novamente… e novamente!
Como reagimos a essa altura dos acontecimentos? Com um coração apertado?
Chegamos junto do pequeno irritado e desiludido e, com a ajuda dele montamos uma torre perfeitamente equilibrada. Batemos palmas e … fim!
Não! Não ao chegamos ao fim. Porque o fim, ou, a finalidade é a aprendizagem! E ela acontece de acordo com o ritmo das crianças.
Na verdade interrompemos um processo que estava indo muito bem. Os pequenos experimentam o mundo inúmeras vezes. Se frustram, se irritam e vão buscando novas estratégias para conquistar os desafios que eles próprios se impõem. Assim, no final dessa jornada, testando novas soluções a cada tentativa, é que o pequeno resolve o problema.
Em que outras situações diárias o professor encontra o dilema de fazer pelo outro?
- comer,
- tirar o casaco,
- colocar o sapato,
- transportar objetos, o prato de comida, o suco,
- subir no trepa-trepa ou no escorregador,
- andar numa mureta,
- fazer as famosas lembrancinhas para a família,
…não acabamos por tomar a dianteira, antecipando a ação das crianças, e resolvendo tudo por elas?
Precisamos ter a consciência de que cada experiência de busca, com ou sem sucesso, representa aprendizagem.
Mas a solução de problemas não é a única conquista da criança. Frustrar-se e controlar-se são exercícios fundamentais que ela carregará pela vida. Sua autoestima também será reforçada, pois saberá que o sucesso foi sua responsabilidade e resultado possível de seu esforço interesse. Perceberá que existem alternativas para planejar estratégias e que é capaz de pensar nelas.
Agora, voltemos ao professor. Tenho certeza que você se viu acompanhando as emoções dessa historinha de perto. Sentiu a ansiedade e a vontade de interferir na situação. Essa ansiedade é que requer paciência!
Quanto mais vezes a criança repete e busca soluções, suas ações ficam mais eficientes. Olhando “por dentro”, é nesse momento precioso de construção de conexões cerebrais que a aprendizagem está acontecendo. Quanto maior e mais sólidas as ligações entre as células nervosas do cérebro, melhor a aprendizagem. E o pequeno poderá utilizar essas aprendizagens em outras situações mais complexas.
Aí começamos a falar em qualidade de aprendizagem e de educação.
Precisamos acreditar nas crianças, acompanha-las, respeitar seus tempos e dar apoio carinhoso. Estabelecendo um vínculo positivo, se colocando ao alcance e mediando a situação para que consigam pesquisar, contribuímos com o desenvolvimento.
É fato que trabalhamos com um grande número de crianças e “fica mais fácil” no dia a dia, ajuda-las a resolverem suas questões, minimizando os estados de frustração. Mas, na verdade, isso não desenvolve! Esse tipo de interferência “empurra os problemas com a barriga”, e as crianças perdem a oportunidade de ampliar seus conhecimentos e lidar com as emoções. Quando crianças pensam em estratégias complexas, sentem e elaboram as emoções estão se desenvolvendo. Será que estamos contribuindo para isso acontecer?
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Leia mais sobre aprendizagem infantil e postura do professor nas postagens:
- O que a criança faz a cada etapa do desenvolvimento
- O que planejar… alguma sugestão?
- Organização de propostas: garantia de brincadeira e aprendizado
- Palavra de… Denise Nalini: cantos de atividades e as tomadas de decisão das crianças
- Planejar é preciso, como chegar ao planejamento que atenda os desejos das crianças?
- Repetir propostas para crianças. Será?
Concordo! Muito importante em respeitar o espaço e tempo da criança no processo ensino aprendizagem. Não podemos atropelar o tempo com nossa ansiedade!